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Complicações vasculares com implantes injetáveis: tratamento com câmara hiperbárica


O uso de preenchimentos faciais tem aumentado ao longo dos anos, por serem não invasivos. Porém, uma das complicações mais temidas é a necrose por obstrução vascular. A necrose iminente pode estar associada a diversos preenchimentos de tecidos moles, ocorrendo após aproximadamente 0,001% dos procedimentos. Portanto, amplo conhecimento da anatomia vascular da face é essencial, especialmente de áreas com vasos terminais.


As complicações da injeção são raras; entretanto, quando há lesão ou compressão de vasos, ou mesmo obstrução intravascular pelo material injetado, elas ocorrem. Existem várias recomendações médicas sobre como tratar a necrose iminente induzida por injeção, que incluem: descontinuação imediata da injeção e tratamento com hialuronidase; aplicação de compressas quentes; tratamento local de feridas; e uso de nitroglicerina, anti-inflamatórios não esteroides (AINEs), anticoagulantes ou antibióticos; entre outros. Em casos graves de necrose cutânea, a Oxigenoterapia Hiperbárica (OHB) também deve ser considerada.


A Oxigenoterapia Hiperbárica é regulamentada no Brasil pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) desde 1995 (CFM nº 1.457/1995), seguindo diretrizes de segurança, qualidade e ética desenvolvidas e revisadas pela Sociedade Brasileira de Medicina Hiperbárica. É um meio terapêutico para fornecer oxigênio aos pulmões a uma pressão superior à pressão atmosférica padrão acima do nível do mar. Este tratamento pode ser administrado em câmaras mono (para um único paciente) ou multilocais (para vários pacientes).


A administração de oxigênio sob pressão leva a concentrações sistêmicas de oxigênio muito altas. A penetração de alguns antibióticos nos tecidos moles é melhorada em condições hiperbáricas. Além disso, as propriedades vasoconstritoras da OHB podem levar à redução do edema e à melhoria da viabilidade tecidual em feridas agudas, como enxertos de pele comprometidos.


A Oxigenoterapia Hiperbárica consiste na colocação do paciente em uma câmara pressurizada que pode variar de 2 a 3 atmosferas de pressão (atm), ou seja, até três vezes maior que a do nível do mar. A alta pressão combinada com a exposição a 100% de oxigênio tem muitos efeitos fisiológicos no corpo. Foi demonstrado que vários deles melhoram a cicatrização de feridas crônicas complicadas.


Um dos efeitos mais dramáticos é uma maior concentração de oxigênio no plasma. A concentração normal de oxigênio no plasma ao nível do mar é de 3 ml/L, enquanto a 3 atm, com oxigênio a 100%, pode atingir aproximadamente 60 ml/L. Este aumento também resulta na liberação de maiores concentrações de oxigênio no tecido isquêmico. A única contraindicação absoluta para este tratamento é um pneumotórax não tratado.


Este trabalho teve como objetivo avaliar qualitativamente a evolução de pacientes submetidos à Oxigenoterapia Hiperbárica para tratamento de oclusões vasculares decorrentes do uso de preenchedores de partes moles.


Metodologia


Este é um estudo retrospectivo de uma série de pacientes atendidos na Clínica Leger que foram submetidos a tratamento com Oxigenoterapia Hiperbárica no Instituto Brasileiro de Oxigenoterapia Hiperbárica (Instituto de Oxigenoterapia Hiperbárica do Brasil) após complicações vasculares decorrentes de preenchimentos faciais. Foram coletados dados descritivos de cada paciente, que incluíam história clínica, dados do evento e tratamento realizado.


Caso clínico 1


Paciente do sexo feminino, 47 anos, foi submetida a tratamento de sulco nasolabial. Polimetilmetacrilato (PMMA) 10% foi injetado com microcânula 22 G. Foi administrada anestesia local com lidocaína 2% e em seguida introduzida a cânula pela comissura oral direita. Nesse momento, o paciente moveu-se abruptamente e relatou sentir dor. Embora a cânula já tivesse sido inserida, o preenchimento ainda não havia sido injetado. Foi administrada injeção retrógrada de 0,4 mL de PMMA no total. Assim que injetado, ao retirar a cânula, o médico responsável percebeu edema na região dos sulcos nasolabiais, que se espalhou para a região malar, e o paciente relatou desconforto no local. Em seguida, observou-se a formação imediata de um pequeno hematoma no trajeto da cânula e, após cinco minutos, a pele apresentava aspecto livedoide em toda região da bochecha. Neste momento foi iniciado o protocolo de tratamento da oclusão, que consiste em massagem intensa na região, aplicação de compressas quentes, prescrição de ácido acetilsalicílico (AAS) 300 mg, prednisona 20 mg e antibiótico profilático. O médico massageou vigorosamente a região e aplicou compressas quentes. Após as providências tomadas, o paciente permaneceu na clínica em observação por aproximadamente uma hora. Como o paciente relatou que a dor havia cessado e foi observada uma melhora relativa; ela recebeu antibióticos e foi mandada para casa.


No dia seguinte, o médico pediu ao paciente uma foto da região afetada; parecia melhor, mas ainda havia um edema bastante significativo. No segundo dia após o procedimento houve melhora do edema e a paciente relatou estar satisfeita com a evolução do caso. No terceiro dia após o procedimento, o paciente evoluiu com pústulas na asa nasal, compatíveis com desconforto tecidual e epidermólise. O paciente foi então imediatamente atendido pelo médico, que deu continuidade ao protocolo e prescreveu ácido acetilsalicílico (AAS) 300 mg e prednisona 20 mg ao dia. Ao exame clínico observou-se mucosa bucal direita isquêmica e pele hiperêmica desde o lábio superior direito, sulco nasolabial, asa nasal, até a glabela; delimitando a região do ramo angular da artéria facial. Além do protocolo tradicional para tratamento da oclusão arterial, o paciente iniciou oxigenoterapia em câmara hiperbárica, acompanhado pelo médico responsável pelo preenchimento e pelo responsável pela oxigenoterapia. O paciente iniciou o tratamento no terceiro dia após o procedimento, sendo submetido a pressão de 2,4 atm em câmara multilugar com inalação de oxigênio a 100% por 90 min, e relatou melhora relativa. O tratamento foi realizado diariamente por mais seis dias, seguindo recomendação do médico responsável pela oxigenoterapia. No acompanhamento diário do paciente pelo médico, pôde-se perceber uma melhora significativa entre cada sessão da câmara hiperbárica. Na quinta sessão (oitavo dia após o procedimento), os médicos responsáveis ​​pela injeção e pela oxigenoterapia observaram que a pele do paciente já havia se recuperado aproximadamente 100%, sem sinais de cicatrizes. O paciente foi submetido a mais duas sessões e em seguida o médico do serviço de oxigenoterapia considerou o tratamento concluído com sucesso, pois reverteu 100% da oclusão arterial com restauração total da pele e tecidos afetados.


Caso clínico 2


Paciente do sexo feminino, 39 anos, possuía prótese no queixo, insuficiente para satisfazer seu desejo. Na avaliação médica foi indicado preenchimento com PMMA para preenchimento da região. Após a assinatura do termo de consentimento pelo paciente, o procedimento foi realizado. Anestesia local com lidocaína 2% foi administrada na região mentoniana e uma microcânula 22 G foi inserida pela porta de entrada para injeção de PMMA 10%. Iniciou-se a correção de uma depressão causada por prótese no lado esquerdo do queixo, porém, ao ser injetado 0,3 mL de PMMA 10%, observou-se hematoma e cianose no queixo. O paciente permaneceu em observação por aproximadamente cinco minutos pelo médico responsável. Foi observada hiperemia estendendo-se da lateral do mento, na região mandibular, até a asa nasal do lado esquerdo, o que é muito característico da oclusão da artéria facial. Assim, o médico iniciou o protocolo de oclusão, massageando o local e aplicando compressas quentes.

Em nenhum momento o paciente relatou sentir dor. Ela permaneceu em observação por mais uma hora na clínica. O médico, ao suspeitar de oclusão arterial, seguiu o protocolo de tratamento e prescreveu antibióticos, corticosteróides 20 mg e ácido acetilsalicílico (AAS) 300 mg por dia antes de dar alta ao paciente. Doze horas após o procedimento, o médico solicitou ao paciente o envio de uma foto da área afetada. O paciente apresentava hiperemia mais intensa na região da artéria facial e hematoma significativo no mento, o que levou o médico ao diagnóstico de oclusão vascular. Por isso, o médico encaminhou e acompanhou o paciente a um centro de oxigenoterapia hiperbárica. O tratamento, supervisionado pelo médico responsável pela oxigenoterapia, foi realizado para reverter o sofrimento arterial da região. O paciente foi submetido a 2,4 atm de pressão em uma câmara multilugar com inalação de oxigênio a 100% por 90 min. No terceiro dia de tratamento, apesar da parte externa da mucosa apresentar aspecto cianótico, houve redução significativa tanto do hematoma quanto da hiperemia da região. No quinto dia de terapia, ou seja, no sexto dia seguinte ao procedimento, o paciente apresentou recuperação de 100% do fluxo sanguíneo, monitorado pelos médicos responsáveis ​​pelo procedimento e pelo tratamento de oxigenoterapia.


Após a quinta sessão de oxigenoterapia o paciente recebeu alta. Sete dias após o procedimento, ela procurou novamente o médico para relatar bem-estar durante uma viagem de carro e 100% da região cicatrizada, sem cicatrizes visíveis.


Discussão


Os efeitos fisiológicos e terapêuticos da Oxigenoterapia Hiperbárica estão relacionados ao seu método de utilização, que consiste em um ambiente com maior pressão atmosférica e administração de oxigênio puro (100%) para proporcionar um cenário ideal para a cicatrização de feridas. Baseado em trabalhos científicos e dados clínicos de mais de 10 anos, este estudo analisou o uso da oxigenoterapia em câmara hiperbárica para tratamento de oclusões vasculares decorrentes de procedimentos de preenchimento.


Segundo estudo transversal realizado em um centro hiperbárico da cidade de Salvador (Bahia, Brasil) no qual foram analisados ​​200 prontuários de pacientes tratados com OHB, as condições de saúde dos pacientes influenciam o resultado dos tratamentos de oxigenoterapia. O diabetes, por exemplo, é um fator significativo que pode afetar a cicatrização de feridas devido a alterações estruturais na membrana celular. Portanto, este estudo considerou pacientes saudáveis ​​que não apresentavam nenhuma patologia que pudesse afetar negativamente o resultado dos tratamentos com OHB.

Estudos já demonstraram que a câmara hiperbárica, quando utilizada em pressão igual ou inferior a 300 kPa por aproximadamente 120 min, é segura. Sintomas graves do sistema nervoso foram observados em 1–2% dos pacientes tratados. O efeito colateral mais comum, observado em aproximadamente 20% dos casos, foi a miopia reversível. Ocorre devido à toxicidade do oxigênio e pode durar semanas ou meses. Assim, o uso da oxigenoterapia associada ao protocolo padrão para reversão da oclusão vascular é seguro quando utilizado de forma adequada e prescrito por profissional médico habilitado.


Um estudo da Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica Estética (ISAPS) de 2018 mostrou um aumento de 10,4% em procedimentos não invasivos, como injeções de preenchimento. Com a maior demanda por esses procedimentos, o índice de complicações também aumentou. Em geral, as complicações relacionadas aos procedimentos de preenchimento de tecidos moles estão associadas a profissionais não qualificados; porém, mesmo quando realizados por profissionais experientes, podem causar reações que variam de pequenas e autolimitadas a graves. Estes requerem tratamento médico imediato, que pode incluir oxigenoterapia hiperbárica. Assim, considerando os estudos encontrados na literatura e os mais de 10 anos de experiência na clínica, é possível validar o uso da OHB no tratamento de complicações de oclusão vascular decorrentes de procedimentos de preenchimento.


Conclusão


Este estudo mostrou a reversão da oclusão vascular resultante de procedimentos de preenchimento facial em pacientes tratados com Oxigenoterapia Hiperbárica. A OHB tem se mostrado eficaz na oxigenação dos tecidos isquêmicos, na redução do edema e na cicatrização de lesões, restaurando assim a pele e os tecidos afetados sem deixar cicatrizes visíveis. É imprescindível que o tratamento seja prescrito por médico habilitado e realizado sob a responsabilidade de profissional especialista em oxigenoterapia hiperbárica, que deve ter experiência no manuseio da câmara hiperbárica, garantindo assim a segurança do paciente, bem como reduzindo efeitos adversos associada à OHB.


Os efeitos clínicos positivos da oxigenoterapia em câmaras hiperbáricas no tratamento de complicações vasculares faciais foram evidentes e seu uso parece muito promissor para futuros protocolos de tratamento de oclusão vascular.


Artigo original em inglês aqui.

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